sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

*O telefonema que mudou a minha vida

 No final de 2009 (mais precisamente no início de novembro) o meu amor decidiu entregar o flat que ele morava e vir morar comigo. Vivemos esses três meses de forma intensa e deliciosa ao mesmo tempo e agora estamos com mais planos... Hora de colocar a vida pessoal em primeiro lugar. Não que eu não goste de trabalhar muito, na verdade eu adoro e vivo atolada de coisas para fazer. Mas quando a gente ama precisa dar espaço para viver plenamente o amor. Por isso as postagens diminuíram, mas em breve tudo se acomodará de forma que eu consiga conciliar minha vida pessoal com minha vida profissional.

Atualização - Janeiro de 2011:

Desde março do ano passado (período que  decidimos nos casar, fiquei envolvida com os preparativos do meu casamento) diminui o ritmo de trabalho, tanto na lavanderia como em relação à astrologia. Existe períodos na vida que é preciso dar mais atenção a vida pessoal, afinal a gente trabalha para viver e não vive para trabalhar.
Veio o casamento, a lua-de-mel. Passaram-se as épocas de festas, o ano de 2011 começou e ainda estou em função de escolher fotos do álbum de casamento, montar o álbum da lua de mel e arrumar a vida de casada. 
A lavanderia e a astrologia ainda vão ter que esperar um pouco, pois agora em meados de fevereiro  surgiram planos de ajudar meu marido na empresa que ele tem uma sociedade. Mas na hora certa as coisas vão voltar ao seu devido lugar.

Atualização - Maio de 2011:

Nos últimos anos eu vinha levando a minha vida conforme minha agenda, meus afazeres pessoais e profissionais sem imaginar que algo poderia acontecer e virar a minha vida de cabeça para baixo. Eu vivia ocupada e atolada de coisas, sem deixar espaço para mais nada, muito menos imprevistos. Mas o que são imprevistos? Como o próprio nome diz, coisas que não se prevê. Mas o corre corre da vida me ocupava tanto, com tantas coisas até banais (como ir ao supermercado, ao banco, ao salão de belezas, ao posto de gasolina) e a minha loja ocupava outro grande espaço do meu dia que eu vivia com pressa, na maioria das vezes atrasada. Faltava tempo para encontro com amigos, telefonemas, emails e a cada dia isso piorava mais. Mas quando eu achava que a minha vida estava difícil, que eu tinha muitos “abacaxis” para descascar a vida me mostrou que o que eu achava que era problema era uma coisa insignificante perto do que estava por vir...


Tudo isso ficou bem claro para mim em um domingo, maio de 2011, era o final da tarde. Eu estava em casa deitada, vendo TV, reclamando dos problemas do meu trabalho com meu marido quando o telefone tocou. Era minha irmã. Falava com a voz seca, dizia poucas palavras, mas me tratou de uma forma carinhosa como há muito tempo eu não via. Como eu a conhecia muito bem sabia que ela não estava normal. Algo tinha acontecido. Um calafrio percorreu a minha espinha enquanto ela lentamente foi me falando que tinha ido a um médico semana passada. Ela não costumava entrar em detalhe desse tipo de coisas comigo, por isso senti meu estômago se revirando. Ela me contou que tinha feito um exame na sexta-feira e o médico acabara de lhe telefonar pedindo que ela fosse ao seu consultório amanhã, logo na parte da manhã, pois eles precisavam conversar pessoalmente. Não é preciso ser muito inteligente para perceber que era algo sério. Nenhum médico iria ligar para um paciente no domingo à noite pedindo para ele comparecer ao seu consultório com urgência se não fosse algo grave. Minha irmã sabia disso. Como além de dona de lavanderia sou astróloga, minha irmã me pediu para que eu olhasse se mapa astral. Desliguei o telefone e fui para o computador. Quando abri a tela me dei de cara com ele: Plutão. Tão pequeno que é considerado um planeta anão, mas tão grande em força e causador de mudanças transformadoras e significativas em nossa vida. Eu sabia que nada ficaria como está. Plutão não entra em uma história para apenas incomodar, ele entra para mexer nas nossas feridas, pois quando plutão coloca a sua mão nos obriga a lidar com a vida de outra maneira. O pior de ser astróloga é olhar com extrema clareza o que vinha pela frente... E eu sabia que vinha chumbo grosso. Quanto mais eu olhava, mais eu queria estar errada. Me dava um monte de justificativas para explicar porque não deveria ser nada daquilo que estava óbvio: A hora de nascimento dela devia estar errada (essa justificativa é a mais fajuta de todas, porque nem se ela tivesse nascido no dia seguinte plutão deixaria de estar ali; depois achei que o programa de astrologia devia estar errado, abri outro programa, e mostrou a mesma coisa...). Então eu passei a achar que estava fazendo a leitura do mapa de forma equivocada. Afinal eu sou humana e posso enxergar uma leitura astrológica distorcida. Até que me rendi que aquilo estava certo. Eu tinha certeza que muita coisa iria mudar não só na vida dela, como na de todos nós. E conforme eu ia olhando o mapa dela, mais eu ia me preocupando. Então eu resolvi olhar outros mapas próximos, o dos meus sobrinhos, o meu, do meu pai... Algo dessa proporção deveria estar marcado no nosso mapa também. E estava. Mudanças e alterações na vida de todos nós. É uma transformação tamanha que parece que nasce um outra pessoa, como uma troca de alma.

E como lidar com essa constatação?

Primeiro conversei com meu marido e logo em seguida decidi ligar para o meu pai. Desde que minha mãe faleceu (há uns 20 anos atrás) ele é a primeira pessoa que eu peço “help”. Liguei e ele não atendeu. Isso me deixou ansiosa. Porque quando temos algo importante para falar as pessoas nunca atendem? Será que era a forma do Universo me fazer analisar mais, rever minhas percepções a respeito da situação antes de falar qualquer coisa com meu pai? Mas quando a gente está aflita não quer nem saber, liga novamente, e liga de novo e de novo até a pessoa atender. E foi isso que eu fiz. Não consegui tirar o dedo do telefone. Até o meu pai atender pareceu que demorou uma eternidade. A nossa vida em família passou toda na minha cabeça naqueles instantes: os momentos que rimos juntas, que brigamos, que fizemos bagunça, que choramos, que comemoramos, que viajamos, que aprendemos, tudo que fizemos em nossa infância e adolescência foi juntas, até que casamos e passamos a ter vidas separadas. Mas os nossos corações jamais se separaram. Nessa hora eu queria estar ao lado dela e abraçá-la com força, mas a distancia de nossas cidades não permitia isso naquele momento. E no meio desse turbilhão de coisas fervilhando na minha cabeça meu pai atendeu o telefone. Só em escutar a sua voz já acalmei um pouco. Meu pai tem esse poder, de me tranqüilizar em todos os momentos. Sua voz equilibrada, mesmo nos momentos difíceis ajuda a me equilibrar. Sua sabedoria e sua postura racional na maioria das situações sempre estiveram acima de qualquer coisa, por isso dificilmente ele tem súbitos de emoções descontroladas. Muito diferente de mim, que não consigo me conter. Ele sempre foi meu porto seguro. É nele que encosto meu barquinho, que volta e meia está desgovernado atravessando águas turbulentas. Pai: uma palavra forte que para mim significa Poder do Amor Incondicional. Desabei tudo de uma vez em cima dele, como águas que estavam contidas por uma represa. Ele com sua sensatez me disse que não deveríamos nos precipitar antes da conversa com o médico, mas que qualquer que fosse o resultado estaríamos juntos, como sempre estivemos. Ele como um canguru, me carregando e carregando minha irmã em sua barriga. Meu pai fisicamente é pequeno, magro, com uma aparência até frágil, até porque já está com idade avançada, mas por dentro é um gigante! Minha mãe faleceu quando eu tinha 30 anos e desde então o meu pai assumiu o papel dos dois. O carinho, a docilidade, o aconchego da minha mãe agora se uniu a sua personalidade firme, segura, com uma nobreza de caráter sem igual. Imagino o quanto é difícil para ele assumir de forma tão exemplar as duas responsabilidades, coisa que ele exerce com maestria. Com o tempo ele foi lapidando ainda mais suas qualidades e se tornando cada vez mais um “paizão”, como uma galinha que abre suas asas para proteger seus pintinhos, as filhas e os netos. Essa proteção sempre foi muito importante para todos nós, mas nunca tinha me passado pela cabeça que iríamos precisar do amparo dele em uma situação difícil como esta que estava para começar a eclodir. Já enfrentamos vários problemas, já tive problemas financeiros (estive a ponto de fechar minha lavanderia algumas vezes), problemas administrativos, afetivos (incluindo divórcio...) e até problemas de saúde bem complicados, como foi à doença de minha mãe e do meu avô. Problemas que envolvem a saúde são sempre mais difíceis de enfrentar. A doença de minha mãe foi algo que nos consumiu bastante. A do meu avô me arrancou um pedaço. Cada um deles com sua partida desta vida extirpou uma parte minha. Rasgou a minha alma e fê-la sangrar por muito tempo. Muitas vezes me questionava porque Deus tira da terra pessoas que tem uma família feliz. A cicatriz da morte deles continua, como um queloide no espírito, que acho que nem se existir outras vidas irá sumir. Agora acontecer com a minha irmã foi uma facada ainda mais profunda e meu pai terá que ser mais uma vez um super pai para nos dar força para enfrentarmos essa batalha juntos. Essa foi uma das noites mais longas da minha vida. No dia seguinte acordei querendo que tudo que aconteceu na noite anterior tivesse sido um pesadelo. Mas não foi. Foi real. E as horas até a consulta da minha irmã com o médico não passavam. Os minutos pareciam horas e os ponteiros do relógio pareciam estar em câmera lenta. Eu não conseguia parar de olhar para o meu celular para ver se ele estava realmente funcionando. Até que ele tocou. Era minha irmã. O tumor era maligno. O caso era de urgência, ela iria se internar imediatamente na emergência.
 
Nesse momento a vida me pareceu estranha, irreal... E o pior que eu não estava nem em casa, nem na minha lavanderia – locais que eu se sentiria mais à vontade para reagir à essa noticia. Minha vida estava em meio a muitas alterações e de repente ela deu um “cavalo-de-pau” , como um carro que roda em uma pista em alta velocidade. Mas as alterações que minha vida vinham tomando não eram nada perto dessa noticia. Ao contrário: No ano passado decidimos casar, casamento desses com festa, cerimônia com daminhas, pajens, violinos... E festa com valsa, chuvas de pétalas de rosa, fogos e tudo mais. Por isso eu passei o ano passado todo cuidado dos preparativos do casamento. Hoje em dia isso toma muito tempo e são tantos detalhes para ver que eu vivi literalmente em função disso. Depois do casamento e da viajem de lua de mel resolvemos mudar algumas coisas. Eu decidi para com a astrologia. Eu fazia horóscopo para vários jornais, e não recebia quase nada em termos financeiros, fazia mais por prazer. E por mais matérias em blogs, revistas e jornais que eu fizesse e até entrevistas em programas de TV, para mim isso não era financeiramente rentável. Meu marido era de uma cidade do interior de São Paulo e estava começando uma empresa nova com alguns sócios no Rio de Janeiro e no início de 2010 decidi ajudá-lo na parte de divulgação da empresa. Eu sou uma pessoa extremamente dedicada a tudo que faço e quando decido fazer algo mergulho de cabeça. E era disso que a empresa do meu marido precisava. Então minha opção foi chegar na lavanderia as 7hs da manhã e ficar lá até as 9hs (ficava apenas duas horas lá... eu achava que como minha empresa já tinha 13 anos poderia andar sozinha). Chegava as 10hs na empresa do meu marido e ficava com ele até fechar... No mínimo até as 19hs... Mas na maioria dos dias ficava lá até as 22hs. Trabalhar tantas horas assim era puxado, mas eu estaria me esforçando para o nosso futuro e estaria ao lado dele. Decidi fazer uma campanha pegando todas as mídias digitais, eu mesma fazendo e divulgando, como uma formiguinha, dia-a-dia. Estava montando um cadastro de mala direta, buscando endereços de pessoas que se interessariam pelo serviço dele. Liguei para todas as pessoas que eu conhecia e daí fazia uma triagem...Uma amiga, Célia, me ajudou muito com 800 nomes...  Outra amiga me ajudou a fazer o lay out de todo material e a parte de design, Cristina. Já outra me ajudava com os títulos na mala direta via email... A Bia me ajudava com a correção do português e assim eu ia tentando fazer um setor de marketing só com ajuda das amigas, elas faziam tudo “0800”, quer dizer, free. Eu mesma comprei as etiquetas e digitei todas uma por uma, eram 5.000 etiquetas. Claro que não foi tão fácil como parece quando eu falo assim. Enfrentei todos os problemas possíveis, para começar com a grana. Os sócios dele não queriam liberar nem o dinheiro nem para um cartucho de tinta da impressora para imprimir as etiquetas. A maioria delas eu fiz em casa e eu mesma pague as tintas, afinal tinha certeza que isso iria dar algum retorno e de uma forma ou de outra o dinheiro iria entrar para mim lá na frente. Mas a cada passo que eu dava tentando fazer a divulgação da empresa dele, milhares de obstáculos surgiam. Uma amiga me apresentou o marido que ia fazer algumas pastas para colocar o material via correio. Ele cobrou adiantado e não queria entregar o material. Isso gerou diversas brigas na empresa... Ele demorou 4 meses para entregar as pastas as custas de muita briga e infelizmente isso custou a minha amizade com sua esposa... Ela era uma boa amiga, mas depois desses atritos com o marido dela nunca mais falou comigo... É uma pena, mas até acho que ela está certa, entre ficar do meu lado estando com a razão e ao lado do marido, que estava sem razão ela optou pelo marido e pelo seu casamento.
 Eu estava terminando o material da mala direta no correio quando soube do problema de minha irmã, então decidi eu mesma bancar as despesas do correio e receber depois da empresa do meu marido. Como eram muitas pastas e mais de 5.000 endereços o valor foi bem alto, mas usei o cheque especial da minha empresa (da lavanderia) e despachei no correio.
Na minha vida doméstica também não tinha moleza. Como não tenho empregada,quando chegava em casa  ainda ia fazer janta e cuidar da casa...  Mas cuidava com prazer, estávamos casados a pouco tempo e eu ainda curtia preparar jantinhas diferentes para ele todos os dias. Buscava receitinhas,  arrumava a mesa, colocava velas, tudo para deixar os poucos momentos que tinhas juntos à sós mais aconchegante. Dormia tarde e levantava cedo. Mas estava feliz, pois estávamos vivendo uma vida em prol nosso futuro. No inicio foi difícil decidir deixar a astrologia, afinal foram cinco anos de estudo e outros tantos atendendo e escrevendo, mas  se a vida pede uma pausa, quem sou eu para ir contra aos movimentos do destino?

Mas tudo isso perdeu a importância mediante a circunstância...


Desliguei oi telefone e fui para casa arrumar correndo minhas malas e fui correndo para São Paulo. Mal sabia eu que aquela era a primeira entre muitas viagens que eu passaria a ter entre Rio e São Paulo. E que minha capacidade de suportar os problemas seria testada inúmeras vezes. Essa era uma viagem sem volta. Uma viagem que o meu ser iria fazer para dentro de mim e tirar lá do fundo uma Mônica que nem eu mesma sabia que existia...
Peguei o primeiro vôo  (independente do preço - comprar passagem em cima da hora é um absurdo) e fui direto para a casa da minha irmã. Por incrível que pareça ela não tocou no assunto da doença nem da cirurgia emergencial. Estava preocupada com a família, já que nesses 25 anos de casada ela sempre teve o controle de tudo. Queria me colocar a par do andamento da casa para que nada deixasse de funcionar, como ela sempre fez funcionar. Ela foi comigo em seu banco, me apresentou ao seu gerente, informando que ia fazer uma cirurgia e que eu resolveria o que fosse preciso. Me levou também na farmácia, no mercado e em todos os lugares que ela costumava fazer compras. Fizemos uma grande compra no mercado, para suprir os dias que ela estaria no hospital. Ela se preocupou em deixar um caderno com tudo anotado, telefones, lista de compras, pagamento da empregada, cheques assinado, tudo que fazia parte de sua rotina. Isso me impressionou muito. Qualquer outra pessoa estaria ao prantos, ou desabafando aquela situação repentina que transtornou a todos, mas ela se mostrava inabalável. Eu mais uma vez admirei minha irmã. Com as emoções sob controle (pelo menos aparentemente) ela estava lidando com a questão do câncer de uma forma exemplar. Falou pouco sobre isso, e o pouco que me disse aceitando de forma serena, dizendo que estava pronta para enfrentar. Eu senti vergonha de mim mesmo. Nossa, por muito menos eu reclamo tanto, praguejo, e fico me sentindo a mais infeliz das criaturas. Ela aceitou aquela prova sem reclamar nada... Não ouvi nenhum tipo de lamuria. Ela só se preocupava com a família. Meus sobrinhos estavam acostumados a terem a vida direcionada por ela, ela levava os dois de carro para a faculdade, tanto que eles nem pensaram em aprender a dirigir. Ela estava fazendo um esquema com as empresas de taxi em volta da sua casa para levarem os rapazes. Deixou o cardápio da semana pronto, para que isso não afetasse a alimentação de todos em casa. E quando a rotina domestica parecia toda programada  resolveu pensar um pouco nela. Nessa hora eu pensei em mim, quantas vezes por muito menos pensei em mim primeiro? Ela realmente nasceu para cuidar de sua família e o faz com maestria. Ela me lembra aquelas donas de casa da década de 50 que a família era a sua vida. Nesse momento senti vergonha de mim mesma, nunca fui assim. Poderia ter sido, poderia ter priorizado minha família e minha casa, mas não o fiz. Trabalhei muito, comecei a trabalhar aos 22 anos, quando me separei do pai de minha filha. Se eu tivesse agido como ela talvez tivesse ficado casada com o meu primeiro marido até hoje. Errei como mãe e como dona de casa. Nessas horas entendo porque algumas pessoas conseguem manter um casamento feliz por tanto tempo, como ela que comemorou feliz seus 25 anos de casada. São as prioridades da vida, cada um prioriza o que acha importante no momento. Alguns tem a felicidade de perceber o real valor das coisas no seu exato momento, outros não. Minha irmã desde o inicio soube valorizar o que realmente importa na vida: o amor, a família, as pessoas de valor a sua volta. Eu não soube. E isso veio como uma avalanche a minha cabeça. Trabalhei duro, vezes até mais de 18 horas por dia. Trabalhei onde não me deram valor. Dei meu sangue por coisas efêmeras,  e deixei passar momentos preciosos. Ela estava passando por um momento crítico e eu que comecei a questionar a vida. Ela estava ali, ao meu lado,  me dava sua mãozinha pequenina (ela tem um metro e meio de altura) e sorria falando que estava muito feliz por eu estar ao lado dela. Me senti uma mosquinha... Quantas vezes podia ter estado ao lado dela e tê-la deixado feliz? Porque precisei que algo assim acontecesse para estar ao lado dela? Ela me pediu para acompanhá-la no salão de beleza. Apesar dela nunca ser sido muito vaidosa, ela queria dar uma geral no make pois sabia que depois da cirurgia e da quimio isso não seria mais possível. E fomos ao salão... Na verdade era mais para curtir o momento de “meninas” juntas do que qualquer outra coisa. Fizemos as unhas juntas, conversamos muito, só lembrando episódios da nossa infância. Foi um momento nostalgia misturado com um momento de medo. Ao mesmo tempo que a gente ria das coisas que lembrávamos da nossa infância e ela se gabava ao contar para a manicure que eu já fui pequenininha, menor que ela e que ela já cuidou de mim quando eu era bem pequena, ela também segurava minha mão de uma forma que dizia seu temor. Um temor silencioso, contido, guardado dentro dela, mas que ali de mãos dadas com ela eu podia sentir. Como se fosse uma porta para entrar dentro dela. Uma porta para seus pensamentos que de um lado estavam felizes por me ter ali ao lado dela, por outro lado, é claro, ela estava triste pelo que estava acontecendo. Mas nessas horas tudo acontece muito rápido. Eu pelo menos queria congelar aquelas horas que a gente estava ali no salão, aquele sorriso dela, aquele aperto de mão... Queria que durasse para sempre, mas sabíamos que em poucas horas estaríamos no hospital e tudo mudaria. Ela não tocou no assunto, como se quisesse curtir aqueles minutos esquecendo do que estava para vir...
 
Na hora de sair do salão minha irmã ainda quis dar mais uma volta comigo. Caminhamos pela rua dela e fomos até uma sapataria que ela tinha o hábito de ir. Ela não é nada consumista, mas é alegre e simpática então fez amizade com as moças da loja. Apresentou-me toda feliz a todos da loja. Me apresentava como um troféu e dizia para todo mundo que eu era linda e o orgulho dela e começava a falar da minha vida, da lavanderia, do prêmio que recebi do SEBRAE e de toda minha divulgação na mídia com a astrologia. Ela se enchia de orgulho e eu fiquei feliz de perceber o quanto ela me admirava. Na verdade de perceber o quanto uma admirava a outra. É muito bom perceber que nosso sentimento é recíproco.Porque demoramos tanto para constatar isso? Mas o dia estava acabando e tínhamos que voltar para a casa dela.
No momento que parávamos de falar eu pensava em Deus...
Desde pequena sempre acreditei em um Deus criador, o todo poderoso que abençoa e protege todas as criaturas e mais do que nunca agora eu recorria a ele. Eu precisava crer na generosidade do coração de Deus.
Minha irmã também depositou muita fé em Deus e em momento nenhum demonstrou nenhum tipo de revolta. Minha irmã não deixou nada abalar sua fé. Ao contrario, passou a ter muito mais fé e passou a rezar não só por ela, mas pelas pessoas que estavam tratando dela: rezou para que Deus iluminasse seu médico, seus assistentes, suas enfermeiras... Ela sempre teve a certeza que Deus estaria sempre perto.
Chegamos à sua casa e todos já nos aguardavam. Eu sentia nos meus sobrinhos e no meu cunhado uma mistura de amor e de medo. Olhando aquela família não pude deixar de pensar como Deus tinha coragem de fazer isso com eles...
Pessoas tão boas, que vivem uma vida de tanto amor... Para mim eles eram aquela família de comercial de margarina, que estão sempre felizes. A única diferença é que o comercial de margarina são atores, é tudo encenação e ali, naquela família tudo é verdade.
Minha irmã cuidou do jantar, na verdade ela fez questão de fazer tudo ela própria, pois sabia que ficaria algum tempo sem poder fazer isso. Comemos pouco. A tristeza não deixava a comida descer. Cada um da sua maneira tentava disfarçar e fingir que nada de muito sério estava acontecendo. Mas todos sabíamos que não era bem assim. Depois do jantar saímos da mesa (sim, minha irmã é daquelas que faz questão que a família jante unida na mesa) e fomos para o sofá ver um pouco de televisão. Nada de jornal ou noticia ruim. Fomos  assistir seriados leves e algo divertido. Ela adora ver programas de decoração, desses tipo “Design Divino” (Com a Candice).  Vimos alguns. Não demorou muito tempo dei boa noite e fui para o quarto. Liguei para o meu marido e comecei a chorar...

No dia seguinte levantamos todos ao mesmo tempo, nos aprontamos e fomos para o hospital. Para quebrar o silêncio meu cunhado conversava no carro com algumas pessoas do seu trabalho. Eu queria que esse trajeto “casa da minha irmã” /hospital não chegasse nunca, mas chegou.  Minha irmã sempre foi muito corajosa em todos os momentos de sua vida e foi com essa coragem ela entrou no hospital. Primeiro fomos para o consultório do médico, que conversou conosco antes de dar entrada em sua internação. Todos ficaram calados, apenas ouvindo o que o medico tinha a dizer. Situação tensa. Ela escutou tudo sem demonstrar nenhum sinal de fraqueza ou medo, mesmo ouvindo do médico falando da gravidade da situação. 
Quando saímos do consultório meu cunhado foi resolver a papelada da internação, enquanto eu fiquei em um pequeno quarto com ela. Nessa hora que percebi como todos os nossos planos para o futuro podem ser alterados pelo acaso, e o destino muitas vezes é cruel...


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